A Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA) e o Ministério Público Federal (MPF) emitiram uma recomendação conjunta pedindo que o governo estadual e a prefeitura de Lauro de Freitas não autorizem a construção do centro de treinamento do Esporte Clube Bahia em território tradicional. A medida visa proteger a comunidade quilombola do Quingoma, certificada desde 2013, que seria diretamente impactada pelo projeto.
Além do CT do Bahia, o documento também recomenda o veto à implantação do empreendimento imobiliário Joanes Parque – Bairro Planejado, previsto para a mesma área. Os órgãos pedem a suspensão de qualquer licença já emitida e alertam para a necessidade legal de consulta prévia à comunidade.
Quingoma: território tradicional e protegido
Localizada em Lauro de Freitas (BA), a comunidade quilombola do Quingoma é reconhecida pela Fundação Cultural Palmares. Desde 2017, há um relatório antropológico que confirma a legitimidade da ocupação tradicional. No entanto, mesmo com essa proteção legal, o território tem sido alvo de empreendimentos que avançam sem a devida consulta à população local.
Durante a pandemia de covid-19, por exemplo, houve tentativa de construção de uma estrada dentro da área quilombola. A obra só foi suspensa após ação judicial. Agora, com o novo projeto do centro de treinamento do Esporte Clube Bahia, a comunidade teme mais uma violação.
Clube é cobrado por coerência com valores sociais
A recomendação lembra que o Bahia tem um histórico de atuação em causas sociais, especialmente através do seu Núcleo de Ações Afirmativas. Por isso, segundo o documento, é fundamental que o clube reflita se construir um centro de treinamento em área quilombola está em sintonia com os princípios que sempre defendeu.
“É crucial refletir sobre a atual proposta do Esporte Clube Bahia de adquirir um terreno na Comunidade Quilombola do Quingoma”, diz a recomendação, que também orienta o clube a suspender qualquer ação relacionada ao projeto até que a comunidade seja ouvida.
Joanes Parque também deve interromper atividades
O empreendimento imobiliário Joanes Parque – Bairro Planejado já vinha sendo anunciado, e imóveis estavam sendo comercializados. No entanto, a recomendação dos órgãos públicos afirma que os compradores devem ser informados de que o terreno pertence a uma comunidade tradicional. Além disso, pede que a comercialização seja suspensa imediatamente.
Segundo os defensores, parte dos empreendedores pode desconhecer o caráter irregular do projeto, já que o município chegou a emitir alvarás de licença sem considerar os direitos da comunidade local.
O que diz a Convenção 169 da OIT?
A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil, determina que comunidades tradicionais devem ser consultadas de forma livre, prévia e informada antes de qualquer intervenção em seus territórios.
O defensor público Gabriel Cesar dos Santos reforça que essa convenção tem força de lei e não pode ser ignorada. “O Estado brasileiro se comprometeu a garantir esse direito, mas infelizmente vemos reiteradas violações, especialmente quando se trata de quilombolas”, afirmou.
Comunidade já sofreu outras intervenções
A comunidade quilombola do Quingoma não enfrenta essa situação pela primeira vez. Já houve construções de bairros, hospitais e até um aterro sanitário sem qualquer diálogo prévio. Em diversos momentos, os moradores aceitaram abrir mão de partes do território para tentar manter a paz e o diálogo com o poder público.
A nova recomendação tem caráter preventivo e busca orientar autoridades e empreendedores a respeitarem os direitos da comunidade e evitarem futuras disputas judiciais.
O que a recomendação exige:
- Que o Estado e a prefeitura não autorizem nem licenciem projetos na área;
- Que o Esporte Clube Bahia suspenda planos para o CT;
- Que o Joanes Parque interrompa as vendas ou informe a situação aos interessados;
- Que qualquer empreendimento futuro só ocorra após consulta à comunidade.
Perguntas frequentes:
O CT do Bahia será mesmo construído?
Não, ainda não há obra iniciada. O projeto foi anunciado, mas agora está sob recomendação de veto.
A comunidade foi ouvida?
Não. Segundo os órgãos públicos, nenhuma consulta prévia foi realizada, o que fere a Convenção 169 da OIT.
Qual o papel do Esporte Clube Bahia?
O clube foi orientado a rever o projeto e a se abster de qualquer intervenção até que a situação seja esclarecida.